Em Caucaia, cidade da região metropolitana de Fortaleza, profissionais entraram em greve devido à falta de pagamento. Prestação de serviços de anestesiologistas no IJF, em Fortaleza, também pode parar
O Sindicato dos Médicos do Ceará tem recebido denúncias de atrasos do salário de profissionais que atuam na rede municipal de saúde em pelo menos 10 cidades do Ceará. Em lista divulgada pela entidade, há unidades em que os pagamentos de outubro de 2024 ainda não foram efetuados. Essas pendências envolvem cooperativas, organizações sociais (OSs), empresas terceirizadas e secretarias municipais de saúde.
O documento enviado à reportagem pelo Sindicato mostra que a inadimplência atinge profissionais que atuam em diversos equipamentos, como Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), hospitais, maternidades e um centro de atenção a pessoas com autismo. Além disso, também há prefeituras que estão em débito com o pagamento da ajuda de custo de participantes do programa Mais Médicos, uma contrapartida de responsabilidade dos municípios.
“O Departamento Jurídico do Sindicato tem recebido as denúncias e está em diálogo com os responsáveis para cobrar respostas e providências. A entidade alerta que esses atrasos prejudicam o funcionamento do sistema público de saúde, afetam a motivação dos profissionais e colocam em risco a continuidade e a qualidade do atendimento à população”, diz a publicação.
Confira, abaixo, as 10 cidades denunciadas:
- Fortaleza
- Caucaia
- Acopiara
- Altaneira
- Capistrano
- Cascavel
- Icapuí
- Iguatu
- Pacatuba
- Sobral
O presidente da entidade, Edmar Fernandes, explica que o problema do atraso salarial de médicos ocorre “desde sempre, há décadas” e que essa é uma das justificativas para a não permanência do profissional onde isso ocorre. “Alguns municípios, não todos, têm a prática de manter o médico em atraso, sem pagar. Ele acaba desistindo de trabalhar no local e vem outro médico”, afirma.
Isso causa, por exemplo, uma grande rotatividade e “uma sensação de que o médico não quer ficar no local porque é elitista ou não gosta de ficar longe da cidade grande”, diz o presidente do Sindicato. “Mas, na verdade, são locais que não pagam os médicos e não oferecem uma estrutura adequada para atender a população”, complementa.
Legenda: Em Fortaleza, médicos dos Gonzaguinhas e Frotinhas, além de outras unidades, estão com o salário atrasado – Foto: Fabiane de Paula
A totalidade da dívida não foi estimada pelo Sindicato dos Médicos do Ceará, uma vez que as denúncias foram feitas por grupos de médicos, “que não tem informação sobre as folhas de pagamentos de todos nem da quantidade de profissionais atuantes nas unidades de saúde”. Porém, segundo Edmar Fernandes, apenas em Caucaia a quantia é de aproximadamente R$ 9 milhões.
Em nota enviada ao Diário do Nordeste, a prefeitura de Cascavel informou que as dívidas herdadas da gestão anterior referentes à contratação do Instituto de Excelência em Saúde Pública (IESP) passam de R$ 10,6 milhões, referente aos meses de junho a novembro de 2024, incluindo os pagamentos dos profissionais. A organização social foi contratada para coordenar os serviços da Unidade de Convivência do Autista (UCA) e das Unidades Básicas de Saúde (UBS).
A prefeitura de Cascavel ainda acrescenta que o total da dívida deixada pela gestão anterior chega a aproximadamente R$ 50 milhões, incluindo o débito com prestadores de serviço, folha salarial, dívidas previdenciárias, entre outros. “A atual gestão está priorizando o pagamento dos servidores, muitos com salários atrasados desde dezembro de 2024, e a manutenção dos serviços essenciais”, afirma, em nota.
Em Fortaleza, as denúncias dão conta de falta de pagamento de profissionais que atuam, por exemplo, nas seis UPAs pelas quais a prefeitura é responsável e no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) da Capital. Além disso, o Instituto Dr. José Frota (IJF) está com um débito superior a R$ 1 milhão com a Cooperativa dos Médicos Anestesiologistas do Ceará (Coopanest).
Com isso, segundo informações divulgadas pelo Sindicato dos Médicos do Ceará na última sexta-feira (24), a Cooperativa informou que a prestação de serviços poderá ser suspensa a partir de 3 de fevereiro. Os serviços não foram interrompidos no ano passado porque houve acordo para que o pagamento de julho fosse efetuado até 29 de novembro e o de agosto, até 10 de dezembro.
GREVE EM CAUCAIA POR FALTA DE PAGAMENTO
Sobre o município de Caucaia, o documento do Sindicato aponta atraso no pagamento de profissionais das UPAs Centro e Jurema, do Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha e do Hospital e Maternidade Santa Terezinha e Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha.
Uma fonte ouvida pelo Diário do Nordeste explicou que os plantões são pagos depois de dois meses e, com isso, em janeiro os profissionais deveriam receber o valor referente a novembro de 2024, o que não ocorreu. Houve uma reunião inicial em que foi acordado que esse valor seria pago no dia 10 de fevereiro e que o empenho seria lançado no diário oficial do município — mas isso também não se concretizou.
“Em seguida, mudou-se o discurso: seria pago no dia 10 de fevereiro (o valor referente aos) plantões referentes ao mês de janeiro de 2025, o que nos deixou preocupados com o receio de não recebermos os dois últimos meses trabalhados de 2024. (…) Sabemos que é uma dívida não paga pela gestão anterior, mas não deixa de ser uma dívida do município”, diz.
Além de médicos, a situação atinge terceirizados, que estão sem receber salário desde novembro de 2024. Nesse cenário, os profissionais da UPA Jurema entraram em greve e os atendimentos estão interrompidos.
“Os do hospital estão mantidos, mas com uma demanda aumentada, já em decorrência do fechamento da Unidade de Pronto Atendimento. (…) O que tem acontecido também são escalas desfalcadas”, afirma a fonte ouvida pela reportagem. Muitas vezes, ainda segundo o relato, faltam profissionais para manter os procedimentos, seja um caso de emergência ou de cirurgia eletiva.
Uma reunião está marcada a manhã desta segunda-feira (27), com o secretário da saúde, Moacir Soares, para esclarecimentos sobre os pagamentos do Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha referente às produções de novembro e dezembro de 2024 e de janeiro de 2025.
Legenda: A totalidade da dívida não foi estimada pelo Sindicato dos Médicos do Ceará, mas apenas em Caucaia a quantia é de aproximadamente R$ 9 milhões – Foto: Fabiane de Paula
DEVEDÔMETRO
Pela recorrência do atraso salarial, o Sindicato dos Médicos do Ceará criou o “Devedômetro”, uma ferramenta para, mensalmente, a entidade mostrar à população “quais são as cidades que, depois de várias tentativas de negociação, continuam em atraso com os médicos”, explica Edmar Fernandes.
Após receber denúncia feita pelos profissionais, a entidade busca resolver a questão, que muitas vezes ocorre por problemas técnicos ou por atraso de poucos dias. “Isso é a maioria, mas existem municípios que não respondem, não dão prazo”, complementa. Após períodos eleitorais, o presidente do Sindicato explica que também há situações em que a nova gestão não reconhece a dívida do ano anterior.
Outra questão apontada por Fernandes é a contratação de organizações sociais (OSs) pelas prefeituras para gerir o sistema de saúde e contratar profissionais, muitas vezes como pessoa jurídica.
“O problema é que quando você entrega esse dinheiro para essa empresa (OSs), não tem mais como rastrear, não existe mais a transparência. (…) Aumentou muito (a quantidade de) profissionais que estão sem receber seus salários. Houve uma explosão. A empresa recebe o dinheiro e não paga os profissionais. Quando você bota a justiça, ela diz que não recebeu e a prefeitura diz que pagou. Quem sofre é o profissional e a população”
Confira, abaixo, as cidades e as unidades de saúde com atraso salarial, segundo o Sindicato dos Médicos do Ceará.
Fortaleza
- UPAs Vila Velha, Bom Jardim e Cristo Redentor (VIVA RIO)
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024. - UPAs Jangurussu, Itaperi e Edson Queiroz (Instituto IDEAS)
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024. - Atenção Secundária – Gonzaguinhas e Frotinhas (COAPH)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - PSF (COAPH)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Samu Fortaleza (COAPH)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Programa Mais Médicos
Atraso nas ajudas de custo de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Instituto Dr. José Frota (IJF)
Atraso nos pagamentos à Cooperativa dos Médicos Anestesiologistas do Ceará (Coopanest) referente aos meses de setembro, outubro e novembro de 2024.
Caucaia
- UPAs Centro e Jurema (RM Gestão)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha (RM Gestão)
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024. - Hospital e Maternidade Santa Terezinha e Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha (COOPANEST)
Atraso no pagamento dos anestesiologistas cooperados referentes aos meses de outubro, novembro e dezembro de 2024.
Acopiara
- Hospital Municipal de Acopiara e Centro Integrado de Saúde (SAUDECOP)
Atraso no pagamento dos plantões de outubro, novembro e dezembro de 2024.
Altaneira
- Médicos contratados no município
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024.
Capistrano
- Hospital e Maternidade Nossa Senhora de Nazaré
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024.
Cascavel
- Unidade de Convivência do Autista (UCA) e Unidades Básicas de Saúde (UBS)
Atraso nos pagamentos de junho a novembro de 2024.
Icapuí
- Hospital Municipal de Icapuí (SAMA)
Atraso no pagamento dos plantonistas referente a outubro de 2024.
Iguatu
- UPA de Iguatu (COOPAIS)
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024.
Itaiçaba
- Programa Mais Médicos
Atraso na ajuda de custo referente a janeiro de 2025, com prazo para pagamento até 24/01/2025.
Pacatuba
- UPA de Pacatuba (COOPECE)
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024.
Sobral
- Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Hugo Mendes Parente
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024.
O QUE DIZEM AS GESTÕES MUNICIPAIS
O Diário do Nordeste entrou em contato com todas as cidades citadas nesta reportagem, por meio da assessoria de imprensa ou por e-mail enviado diretamente à secretaria municipal de saúde. Até a publicação da matéria, apenas os municípios de Fortaleza, Caucaia, Acopiara, Cascavel e Sobral retornaram o contato. O Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Ceará (Cosems CE) também foi procurado pela reportagem, mas não respondeu à demanda.
Fortaleza
- UPAs Vila Velha, Bom Jardim e Cristo Redentor (VIVA RIO)
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024. - UPAs Jangurussu, Itaperi e Edson Queiroz (Instituto IDEAS)
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024. - Atenção Secundária – Gonzaguinhas e Frotinhas (COAPH)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - PSF (COAPH)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Samu Fortaleza (COAPH)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Programa Mais Médicos
Atraso nas ajudas de custo de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Instituto Dr. José Frota (IJF)
Atraso nos pagamentos à Cooperativa dos Médicos Anestesiologistas do Ceará (Coopanest) referente aos meses de setembro, outubro e novembro de 2024.
Caucaia
- UPAs Centro e Jurema (RM Gestão)
Atraso nos pagamentos de outubro, novembro e dezembro de 2024. - Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha (RM Gestão)
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024. - Hospital e Maternidade Santa Terezinha e Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha (COOPANEST)
Atraso no pagamento dos anestesiologistas cooperados referentes aos meses de outubro, novembro e dezembro de 2024.
Acopiara
- Hospital Municipal de Acopiara e Centro Integrado de Saúde (SAUDECOP)
Atraso no pagamento dos plantões de outubro, novembro e dezembro de 2024.
Altaneira
- Médicos contratados no município
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024.
Capistrano
- Hospital e Maternidade Nossa Senhora de Nazaré
Atraso no pagamento referente a dezembro de 2024.
Cascavel
- Unidade de Convivência do Autista (UCA) e Unidades Básicas de Saúde (UBS)
Atraso nos pagamentos de junho a novembro de 2024.
Icapuí
- Hospital Municipal de Icapuí (SAMA)
Atraso no pagamento dos plantonistas referente a outubro de 2024.
Iguatu
- UPA de Iguatu (COOPAIS)
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024.
Itaiçaba
- Programa Mais Médicos
Atraso na ajuda de custo referente a janeiro de 2025, com prazo para pagamento até 24/01/2025.
Pacatuba
- UPA de Pacatuba (COOPECE)
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024.
Sobral
- Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Hugo Mendes Parente
Atraso nos pagamentos de novembro e dezembro de 2024.
O QUE DIZEM AS GESTÕES MUNICIPAIS
O Diário do Nordeste entrou em contato com todas as cidades citadas nesta reportagem, por meio da assessoria de imprensa ou por e-mail enviado diretamente à secretaria municipal de saúde. Até a publicação da matéria, apenas os municípios de Fortaleza, Caucaia, Acopiara, Cascavel e Sobral retornaram o contato. O Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Ceará (Cosems CE) também foi procurado pela reportagem, mas não respondeu à demanda.
CASCAVEL
Em nota, a Prefeitura de Cascavel afirmou que reconhece a “delicada situação” enfrentada pelos profissionais vinculados ao Instituto de Excelência em Saúde Pública (IESP), mas que até o momento não há previsão de quitação da dívida, uma vez que “funcionários efetivos, inclusive da saúde, também enfrentam atrasos salariais”.
“Esses servidores ainda aguardam o pagamento referente ao mês de dezembro de 2024, o qual será priorizado, juntamente com a folha de janeiro de 2025. É válido destacar que o total da dívida deixada pela gestão anterior, chega no montante de aproximadamente R$ 50 milhões de reais. (…) Somente após o equilíbrio financeiro das folhas de pagamento dos servidores efetivos, será possível analisar a situação dos prestadores de serviço, entre eles o IESP”, diz a nota.
CAUCAIA
A Prefeitura de Caucaia informou que os salários de médicos da rede municipal de saúde referentes aos meses de novembro e dezembro de 2024 “nem sequer chegaram a ser empenhados pela gestão anterior” e que, por isso, a atual gestão precisa dar início ao procedimento administrativo de reconhecimento de dívida.
“Compreendendo a relevância do serviço prestado à população de Caucaia e com a intenção de normalizar os atendimentos com a maior celeridade possível, o prefeito Naumi Amorim já autorizou o início do processo de reconhecimento da dívida e os processos estão em tramitação. A Prefeitura reforça ainda que segue em permanente diálogo com os profissionais de saúde para pagar os salários atrasados da gestão passada”, afirma.
Conforme a gestão, uma reunião com a Fundação Leandro Bezerra, responsável pela administração da UPA, foi convocada para discutir questões operacionais. Não foi divulgada a data da reunião.
SOBRAL
A Prefeitura de Sobral, em nota, via Secretaria da Saúde, informou que realiza repasses dos recursos destinados à gestão da UPA e reforça “compromisso com a continuidade dos serviços de saúde oferecidos à população”.
Conforme a gestão, uma reunião com a Fundação Leandro Bezerra, responsável pela administração da UPA, foi convocada para discutir questões operacionais. Não foi divulgada a data da reunião.
FORTALEZA
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) da Capital afirmou que realiza levantamento completo do déficit financeiro deixado pela gestão anterior da Prefeitura de Fortaleza junto aos contratualizados que prestam serviço à Rede Municipal de Saúde. A programação, segundo a Pasta, é realizar o repasse de recursos para as organizações sociais e cooperativas até o fim da semana.
“As Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) gerenciadas pelo município, localizadas nos bairros Vila Velha, Cristo Redentor, Bom Jardim, Itaperi, Jangurussu e Edson Queiroz, assim como os hospitais municipais, continuam realizando atendimento de urgência e emergência”, informou.
No caso do IJF, em nota, a assessoria de comunicação do hospital informou que desde o início da atual gestão “está em contato com os fornecedores de serviços e materiais do hospital para analisar os contratos e as pendências deixadas pelo exercício anterior, visando a normalização dos atendimentos”.
Nesse processo, uma das ações, segundo o IJF, foi o agendamento de reuniões com os médicos cooperados em atividade no hospital. Não houve detalhamento das datas dessa agenda de encontro.